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Nadja Claudino

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Crime Bárbaro Em Ano de Copa do Mundo

19/03/2014 às 09h24

Há coisas que exercem um fascínio enorme. Muitos tentam negar, outros admitem timidamente.  Jornais, revistas e sites confirmam todos os dias: a violência dá ibope, aumenta os cliques, desperta a curiosidade. Quanto mais escabroso o crime mais gera curiosidade. Envolvendo pessoas ricas, bem nascidas, causa histeria coletiva, todos com ânsia de saber o motivo que levam pessoas “limpas” a cometerem barbaridades. Se tiver imagens nítidas, tanto melhor. Os mais sensíveis, escandalizados, ensaiam tapar os olhos com as mãos.  Não resistem e olham. A violência choca e fascina.

Não é de hoje que a violência é transformada em espetáculo. Em outros tempos ela não era tão constante. Os crimes não tinham as motivações de agora. Não se matava por dívidas de drogas, para roubar um bem ou em brigas de gangues. Matava-se por inveja, ódio, paixão, ciúmes, loucura. Por trás de cada crime havia um mistério. Os jornais discutiam os motivos, inventavam teorias, acusavam o assassino, santificavam a vítima e nisso vendiam mais e mais exemplares. 

O historiador Boris Fausto no livro “O crime do Restaurante Chinês” desvenda as diversas nuances de um crime e acaba fazendo um retrato da história do Brasil, principalmente da cidade de São Paulo. São Paulo, em 1938, época dos assassinatos era uma cidade em pleno desenvolvimento industrial, lotada de imigrantes. Foi nessa cidade que um casal de chineses desembarcou. Eles abriram um restaurante. Na tentativa de “fazer a América” encontraram não à fortuna, mas a morte.

Como nem só de vítimas é feito um crime, o historiador também traz a figura do personagem principal, o assassino. Jovem, negro e pobre, empregado demitido do restaurante. Numa quarta-feira de cinzas, depois de brincar o carnaval, decide se vingar dos ex-patrões. Arma-se de mão de pilão e trucida os chineses e mais dois empregados que dormiam no restaurante. Sem dó nem piedade. O crime é intimamente ligado à folia, como se a euforia do carnaval, a cidade entorpecida pelos festejos, tivesse de alguma maneira o possibilitado. A chacina também é o fim dos festejos. Na quarta feira de cinzas São Paulo acorda com a notícia daquele crime horrível. O fim da ilusão do carnaval, à volta brutal à realidade. 

Boris Fausto discute a estrutura da sociedade brasileira no final da década de 30, usando o crime do restaurante chinês como exemplo. Dessa forma, parte do micro para entender o macro. Ele mostra o carnaval, festa que diferenciava os ricos dos pobres; explora o preconceito racial, já que o assassino era negro e isso foi exaustivamente debatido pela imprensa; desvenda como viviam os imigrantes e discute futebol, pois 1938 foi um ano de copa do mundo.  Extraordinária semelhança entre o criminoso e o craque Leônidas da Silva, o “diamante negro” pesou para que a opinião pública se apiedasse do assassino.

O crime não compensa, dizem, e isso é uma verdade incontestável. Hoje eu falo que o crime fascina, e os jornais não me deixam mentir. E até mesmo você, leitor amigo, confirma isso ao terminar de ler essa crônica. 

Nadja Claudino

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Contato: [email protected]

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