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Francisco Cartaxo

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O fim do mundo

28/11/2014 às 18h29

Nos 13 e 14 deste mês, os jurados da comarca de Olinda condenaram três pessoas – Jorge Beltrão Negromonte, Isabel Torreão Pires e Bruna Oliveira e Silva – porque elas mataram, esquartejaram e, depois, comeram partes do corpo de Jéssica Camila Pereira. Na época, 2008, Jéssica tinha 17 anos e era mãe de uma criança de meses. O crime ocorreu em Olinda. Estarrecidos, os jurados ouviram Jorge (52 anos) confessar ter participado da morte e comido a carne de Jéssica. Ao final, de olhos fechados fez esta oração: “Pai celeste, em nome do teu filho Jesus Cristo, eu peço perdão pelos meus pecados. Peço consolo às famílias da vítima e força para Isabel e Bruna.” Isabel (53 anos), nervosa, disse não ter participado do crime, apenas limpou o chão, depois assou a carne de Jéssica e comeu com arroz. Bruna (28 anos), muito segura, afirmou: “Eu não matei ninguém. Eu participei, é uma grande diferença. Eu só ajudei a segurar Jéssica para Jorge matar. Para eles parecia coisa normal, mas nem em filme eu vi aquilo”. De fato, ela “apenas” segurou a garota para Jorge passar a faca na jugular de Jéssica. Que horror!  

Por que fizeram isso?

Para a “purificação das pessoas”, em nome de uma seita, invenção de Jorge, um mestre de artes marciais, que tinha entre seus rituais a morte de meninas de rua, a fim de impedir que gerassem filhos. Jorge, Isabel e Bruna viviam um triangulo amoroso, desde que Bruna, ainda menor, integrou-se ao grupo, no Rio Grande do Norte, quando frequentava aulas de artes marciais. Isabel aceitou “por amor” a nova mulher de Jorge, uma morena jovem, forte, insinuante. 

Após 40 horas de reunião do Tribunal do Júri, os três foram condenados a penas entre 19 a 22 anos. Mais cadeia, entretanto, vem a caminho. O trio de canibais deve responder a novo júri por ter cometido dois outros crimes semelhantes, na cidade de Garanhuns, em 2012, quando teriam utilizado carne de duas adolescentes como recheio de empadas e coxinhas… Dizem. O novo julgamento não foi ainda marcado porque o advogado do trio criminoso foi preso, acusado de desvio de recursos públicos quando era prefeito de município pernambucano…    

Ao acompanhar tais fatos pela imprensa, lembrei minha mãe. Cearense, nascida em Várzea Alegre em 1904, aos 10 anos ela veio com a família para o oeste da Paraíba, por causa da chamada “guerra do Crato contra Juazeiro”, fugindo de perseguições políticas de seguidores do padre Cícero e Floro Bartolomeu. Aqui, ela permaneceu até morrer, em 1996, com 92 anos de idade. Viveu, portanto, em época de muita violência, de atrocidades praticadas por cangaceiros e pela polícia, no tempo de Lampião e outros tempos. Menino, eu a ouvi narrar cenas horripilantes de lutas entre famílias, de cruéis vinganças, perversidades, humilhantes castigos impostos a inimigos ou traidores, muitos deles inocentes. Ela citava também casos de heroísmos e bondade naquele mundo de violência que era o sertão nordestino do século XX. 

Diante de situações chocantes, minha mãe costumava usar esta frase: “isto é o fim do mundo”. Dizia e deitava seu olhar na linha do horizonte, quem sabe, a procura de resposta do seu tão amado Deus. Mesmo com toda a experiência de vida e de leitura (dona Belinha era constante leitora de romances), minha mãe, se viva fosse, repetiria aquela frase, em face dos crimes praticados pelos “canibais de Garanhuns”: “é o fim do mundo”. 

Francisco Cartaxo

Francisco Cartaxo

Francisco Sales Cartaxo Rolim foi secretário de planejamento do governo de Ivan Bichara, secretário-adjunto da fazenda de Pernambuco – governo de Miguel Arraes. É escritor, filiado à UBE/PE e membro-fundador da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL. Autor de, entre outros livros, Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras no cerco ao padre Cícero.

Contato: [email protected]

Francisco Cartaxo

Francisco Cartaxo

Francisco Sales Cartaxo Rolim foi secretário de planejamento do governo de Ivan Bichara, secretário-adjunto da fazenda de Pernambuco – governo de Miguel Arraes. É escritor, filiado à UBE/PE e membro-fundador da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL. Autor de, entre outros livros, Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras no cerco ao padre Cícero.

Contato: [email protected]

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